Uma ação digna de aplausos vem dando o que falar. O único hospital que oferece cirurgia plástica facial no Oriente Médio, o Hospital Reconstrutivo de Al- Mowasah, em Amã, vem ajudando pacientes feridos pelos conflitos da Síria, Iraque, Iêmen, entre outros, a curar ferimentos não somente físicos, como também psicológicos.
Entre muitos casos, encontra-se o de Mohammad Naji – um jovem garoto de 9 anos de idade que estava brincando de bicicleta próximo a sua casa quando foi atingido por uma bomba. O ataque aconteceu em 2012, durante um atentado na fortaleza sunita de Bagdá. Mohammad acredita que a bomba tenha sido plantada por simpatizantes de militantes xiitas, mas não pode afirmar com certeza.
As feridas da guerra acompanham todos os pacientes do Hospital Reconstrutivo no Oriente Médio. A equipe médica realiza operações de alta complexidade e usa tecnologia de ponta (como próteses impressas em 3D) para reconstruir membros mutilados e combater infecções. O trabalho é dificultado pelo alto índice de resistência das bactérias, resultante do uso indiscriminado de antibióticos na região. Os profissionais ainda se esforçam para reparar o dano psicológico de seus pacientes.
As lesões físicas ocupam a maior parte do horário de atendimento dos médicos em plantão, pois requerem cuidados especializados e, na grande maioria das vezes, urgentes. No entanto, as cicatrizes psicológicas que os acompanham provaram ser um desafio ainda maior.
A violência, cada vez mais presente, obrigou muitas pessoas a fugirem de suas casas em busca de segurança, muitas vezes encontrada em países vizinhos, como a Jordânia por exemplo.
A missão deste hospital, financiado e administrado pela MSF (Médicos sem Fronteiras), é ajudar os pacientes a reconstruírem suas identidades. A grande maioria dessas pessoas acabam revivendo seus traumas apenas ao olharem-se no espelho.
Doze anos após sua criação, o hospital tem um orçamento anual de quase €12 milhões, um dos maiores da MSF, e é referência internacional pela expertise desenvolvida no tratamento de feridos de guerra.
O hospital possui oito andares e é o lar de 148 pacientes, sendo 60% deles refugiados sírios. O processo de transferência para esse hospital é bastante complexo, e conta com uma rede local de agentes com ligação médica que age selecionando os pacientes conforme suas necessidades e urgência, transferindo-os para Amã. O principal critério para a admissão de um caso não é estético, mas sim reparador, avaliando as chances de recuperação de funções e movimentos.
Os traumas psicológicos são grandes, principalmente em crianças. As com lesões faciais são ainda mais prejudicadas, sofrendo com baixa autoestima e pensamentos depreciativos, como imaginar a si mesmos como monstros, por exemplo.
Estudos mostram que os pacientes com lesões faciais são mais propensos a apresentarem sintomas de depressão, ansiedade e tendências suicidas. Já em casos de amputação infantil, as crianças podem desenvolver uma sensação de inferioridade e perda.
No hospital, essas crianças podem contar com o cuidado da equipe médica e, mesmo diante dessa situação, ainda podem brincar e fazer atividades como desenho e pintura na sala de recuperação da instituição. Essas atividades, por mais simples que possam parecer, fornecem maneiras para que as crianças liberem suas emoções.
Os atendimentos e cirurgias dividem-se em ortopédicas, maxilofaciais e plásticas.
Segundo Gwenola Ghanes, que fornece apoio psicossocial através da MSF, enquanto a cirurgia plástica ajuda os pacientes a se recuperarem de suas feridas físicas, suas cicatrizes mais profundas não são visíveis:
“O rosto é a parte social do corpo, através da qual as pessoas expressam suas emoções e interagem uns com os outros”, disse Ghanes. “Ao fornecer suporte psicológico, nós os ajudamos a recuperar confiança e a lidar com a maneira como as outras pessoas olham para eles”.
Infelizmente, uma cirurgia bem sucedida não garante uma mudança imediata, psicologicamente positiva. Alguns ainda podem sentir-se decepcionados com os resultados da cirurgia e entrar em estado de negação, raiva e depressão, antes mesmo da recuperação cirúrgica.
A equipe do hospital tenta preparar os pacientes para os desafios do mundo real. Porém, o resultado dessa preparação não pode ser mensurado, já que a sua adaptação fora do hospital não é acompanhada.
Devido ao grande número de refugiados na região, os adultos feridos, em particular os homens, geralmente acabam recebendo pouco apoio psicológico.
Os esforços para atender a todos são grandes. Os profissionais são muito importantes na recuperação desses pacientes e exercem muitas vezes o papel de amigo, em solidariedade à essas pessoas.
Desde 2006, quando a MSF começou a executar um programa de cirurgia reconstrutiva, já foram operados com sucesso mais de 11.000 pessoas, dos quais 20% são crianças – principalmente do Iraque, Gaza, Iêmen e Síria. A importância desses atendimentos é enorme e garante mais do que reparo físico, pois é responsável por oferecer uma nova oportunidade de vida às vítimas.